terça-feira, 27 de março de 2012

Despedida em soneto torto

Vai ver hoje em alto e diferente mar ventar;
Arrumarei o meu armário sem arrumar;
Agora eu em outro no longe distante lugar;
Em viajar no meu fechado idioleto de ar.

Despi-me de ti, sim despi-me, pois;
E completamente nua de teu falso sorriso:
Posso fazer um voltei a dançar de depois;
- Dos laços não libertos eu antes deles te aviso!

O que fora dado a mim de má vontade;
Retruco agora com meu grito de soltura;
Lambendo meus eus sedentos por igualdade.

E quero que fujas cego sem Tirésias eternamente;
Do meu sorriso que a ti nunca mais poder verá;
- Sufoques, e que, sufoques... termine no Tártaro quente! 

domingo, 25 de março de 2012

Ansiedade, Tristeza, Espírito e Conclusão

Quando a incerteza do sentimento passa da ansiedade para a constatação, ou o indivíduo se permite curar e passa a viver bem, ou permite que o sentimento de tristeza outrora eminente agora se manifeste e tome conta da parte física, começando pela melancolia, passeando pelo choro e, em últimas consequências, levando a atos de lesão ao próprio corpo endógenas e exógenas.

A cura é algo que deve ser cultivado. Deixado de lado o cultivo, volta a instabilidade a se manifestar. Com a instabilidade dos sentimentos, o indivíduo torna permissiva a manifestação da "ex-curada" ansiedade. Assim, a ansiedade retorna devido à instabilidade do espírito (o de Hegel) que busca rotatoriamente o retorno da estabilidade, ou seja, o retorno a si, o retorno em si.

O retorno em si, ou seja, a estabilidade do espírito, pode ser ligado a uma ideia de que o espírito é capaz de encontrar estabilidade a partir do momento em que para de se questionar. Para que haja essa cessão de questionamentos, ou o indivíduo terá de abandonar as suas dúvidas, ou resolvê-las. Como a subjetividade das dúvidas é muito alta, a maior parte dos indivíduos parece optar por deixá-las à parte, acessando-as de tempos em tempos, a fim de tentar resolvê-las mais tarde em busca da "calma" e "final de buscas" do espírito. Pois abandoná-las ou resolvê-las é impossível. Os indivíduos que não conseguem deixar essa inquietação à parte têm a grande probabilidade de desenvolver estados de ansiedade e quadros de tristeza.

Entendendo o espírito como manifestações de dúvidas diversas do indivíduo, chega-se à conclusão de que o jeito mais simples de lidar  com os questionamentos humanos sem auto-agressão, física ou psicológica, é escrever um poema e depois sair dar uma volta de bicicleta. Se possível, cair no mar e se lavar. Viver é uma coisa doce para quem permite.







segunda-feira, 12 de março de 2012

Por que Proust

Explicar a arte por meio de palavras, explicar a vida por meio da arte. A obra literária de Proust é uma demonstração do trabalho do escritor em transmitir por um romance a sinestesia do "amante" das artes e do "observador" do significado real da vida. É um trabalho que transmite pela leitura a imagem de uma cena teatral, a imagem de um telejornal, os sons, os odores, os sabores, tudo escrito de maneira engenhosa e artisticamente cuidadosa, uma leitura que penetra todos os cinco sentidos do leitor.

Ler uma cena Proustiana é permitir-se acessar o desconhecido de nosso inconsciente. É deixar-se fazer resgatar sentimentos sobre os quais nunca depositamos a nossa atenção. Ler a cena em que o herói "ouve" a grande Berma é permitir-se passar pelo herói e permitir-se também, deixar-se tomar pelas suas sensações. É como se também tivéssemos, assim como o herói, tido a oportunidade de ouvir Berma interpretando Fedra.

Os dissabores em ouvi-la, comparados às experiências do narrador, que não é uma criança, mas um "eu" que fala de sua experiência no teatro quando era um adolescente, é um convite para uma reflexão sobre "aquilo que se espera" e "aquilo que se tem". Logo, a decepção do herói com relação a Berma é frustração porque o que ele espera é diferente do que ele imaginara. Não é questão da cena ser ruim ou boa: simplesmente é uma questão de frustração. A literatura de Proust, assim, é um convite ao mundo do "eu" aprofundado nas mais intrínsecas particularidades do universo do indivíduo.