terça-feira, 1 de janeiro de 2013

2012 de Noêmia

O primeiro dia do ano já não existia e a data que marcava a entrada de 2013 já não era mais primeiro de, mas tão somente o dia seguinte.

Noêmia, esse era o nome da jovem que estava neste instante sentada em uma beira de estrada a pensar no seu último ano, em suas aventuras, em suas desventuras, e em todo o tempo que deixara escorregar por entre os vãos de atitudes ignotas, pensava que não mais se lembrava de como havia sido seu primeiro de janeiro de 2012, com quem estivera, como se vestira, e coisas assim... mas lembrava-se de como se sentira: enleada.

Começaria um trabalho que não era dos piores mas que lhe cobraria uma atenção e um tempo os quais ela não estava disposta a dispender. Suas metas profissionais eram bem diferentes daquele trabalho no qual se metera por necessidade. O fez até o tempo em que ela nele foi precisa.

Meteu-se durante o ano todo em neblinas reais e metafóricas. As reais punham-lhe em risco a vida. As metafóricas, punham-lhe o espírito. Atormentada, mas insistente em manter a lucidez e a calma, continua seu trabalho mecânico-pedagógico-intelectual. Sofre a cada dia com o desprazer do que faz. Odeia seus discípulos a mostrarem isenção. A ofensa que sente a cada gesto de cada um deles a enche de amargura e a afasta cada vez mais de sua aspiração real. Embora todo aquele trabalho a enfastiasse, ele lhe garantia o necessário dinheiro maldito, e também servia para que ela se esquecesse do demônio que a atormentava dias e noites diligentes. Já não dormia e nem ficava acordada. Fazia simplesmente.

Lirtovir e dormir.

Noêmia, com sua beleza de flor, dorme, acorda, trabalha, faz de conta que está tudo bem, pois existe Lirtovir, o Deus contemporâneo daqueles que não conseguem mais acreditar em nada com fé que seja pura, pois duvidam de tudo que leem; começa a escolher partidos antes não tomados e, com isso, redescobre aproveitar o que já sabia, e num repente, sorri. Voltou a sonhar, coisa que já acreditava não se poderia mais fazer.

Abraçou um elefante lindo e pesado, o acariciou, e sentiu por ele amor. Neste elefante estavam belezas escondidas, e ele lhe dizia: "imitatio et representatio". Este mesmo elefante lhe baixou a tromba, convidou-a para que subisse, e mostrou-lhe que ali, em cima dele, o maldito dinheiro seria menor, mas dali, ela poderia ver de cima uma flor que havia nascido no asfalto. A mesma flor que Noêmia vira nascer há 6 anos, mas que julgava ser um acidente do acaso, e a via singela e pobre, no asfalto duro, com dó, imbuída de comiseração, insistindo em manter-se naquele lugar que não era para ela, esta mesma flor, vista de cima do elefante, vista de um ângulo diferente, tinha um miolo bem amarelinho alaranjando como o sol a se pôr num fim de tarde de inverno serrano e sereno. Suas pétalas pareciam ter sido pinceladas por um Deus que fosse de todos os seres humanos - coisa rara na história de nossa humanidade -, pois a cor que emanava daquela reação químico-física era de um enriquecer do espírito e da alma que humano algum pudesse julgar ser capaz de representar em tela, e se fosse a flor fotografada, perderia a vida do balançar das suas corolas.

E assim, Noêmia passou por aquela flor admirada daquela outra altura; disse-lhe adeus, e seguiu sua nova viagem em cima do elefante, acariciando as costas do animal e seguindo o caminho apontado pela tromba do grande e dócil bichinho: veredas.

2013